Friday, December 16, 2005

Depois de um longo inverno, algo sobre o que escrever.

Fante e Schumacher. Quem diria.

Dream a little dream of the Hill. John Fante, que de “in”fante não tinha nada quando escreveu “Sonhos de Bunker Hill”, já estava esperando a visita do Ceifeiro Medonho, mas não deixou sua pena cair, mesmo cego e paralítico quando foi atingido pela diabetes. E não deixou por menos. Trouxe seu alterego, o eterno Arturo Bandini, pouco depois dos acontecimentos de “Pergunte ao Pó” com toda a força sublime e inocente que o personagem traz consigo. Bandini é a epítome de todos os jovens sonhadores, não importa qual seja a época em que eles venham.
Todos sonham um dia em ganhar dinheiro ficar rico enfim, principalmente se o dinheiro vem no que a gente mais gosta de fazer – no seu caso, escrever. Aqui ele já aparece um pouco mais maduro, se acotovelando no microcosmos do centro de Los Angeles, esperando a sua grande chance de finalmente acontecer. E o que acontece quando Bandini “acontece”? Quando consegue sua chance de ser um roteirista de um grande estúdio de Roliudi? Dos roteiros para a vida de escritor, os amigos descartáveis, os amores frustrados, os livros não escritos e o retorno frustrante ao coração do lar caipira.
A prosa de Fante vem mínima, quase quebradiça, sequências e pequenas esquetes dos personagens que vivem na Cidade dos Anjos e como ele continua se perdendo nos atalhos e vielas que a vida traz – por mais brega que soe a oração anterior. No fim das contas, a única coisa que se pode fazer é continuar escrevendo, mesmo estando num quarto imundo com apenas dezessete reais no bolso. Continue andando, é a frase principal. Sem olhar para os lados, exceto quando se atravessa a rua.
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Quem diria. Joel Schumacher consegue fazer um filme que não seja gay-camp. Primeiro foi “Por Um Fio”, quase um filme conceitual se pararmos para pensar. E agora, “TigerLand”. Certo, não tão “agora”. Mas vale a pena falar desse filme, afinal de contas trouxe à ribalta o irlandês Colin Farrell, o Liam Gallagher do cinema. (espero que ele se recupere logo do over que teve no fim das filmagens de “Miami Vice” em Punta Del Este”. Tudo bem que é Miami, cocaína e anos oitenta, mas nem por isso você vê o povo saindo com blazers de ombreiras a torto e direito)
“Tigerland” é o nome da última parada dos recrutas americanos antes de enfrentarem os V.Cs no Vietnã. Um simulacro de guerra com tudo o que o pacote pede: vida de cão, stress, violência desnecessária. Roland Bozz é um desses recrutas mas faz questão de não levar a guerra a sério – por isso ele é tido como o garoto-problema da Companhia no campo de treinamento na Louisiana. Mas como é mais esperto que a maioria de seus superiores (e por isso é tratado de maneira diferenciada), ajuda os mais coitados a darem um jeito de se livrarem da sina macabra de morrer furado de balas em algum campo de arroz no sudeste asiático. A admiração de muitos na sua unidade – como a de seu grande amigo Recruta Paxton (Matthew Davis) - e a antipatia de um de seus colegas de alojamento, o recruta Wilson (Shea Wigham). Ser o único a questionar a utilidade da guerra dentro de um quartel ianque pode ter seus problemas, como a “cena do rádio”, quando o sargento instrutor decide “ensinar outros meios de se usar um rádio”, como eletrocutar as partes íntimas de um prisioneiro vietcong.
A abordagem de Schumacher demonstra momentos de estresse, idílio e a simples exasperação que uma guerra traz para cada um de seus envolvidos. Nas cenas de treinamento de campo a câmera treme como se fosse um personagem participante da ação, e mostra com apenas uma pequena forçação de barra como uma pessoa comum pode acabar virando um cérebro de pudim de leite no Exército. Libelo pacifista vintage sem muita afetação. Quem diria.

Detalhe: depois de Scarface, todo mundo se esforça para superar o número de palavrões em um filme. A palavra “fuck” foi pronunciada 276 vezes em menos de 100 minutos. Que maravilha.
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NEXT: Clássicos rasos que você só encontra aqui! E também a tradução completa de “Como Ser um Critico de Rock” do Lester Bangs...

Tuesday, November 01, 2005

Um pequeno comercial


E quando for possível a gente faz mais resenhas.

Márquez e Vonnegut. Já que estou nesse "entre-guerras", vamos pegar pesado para um anaeróbico cerebral.

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Gabriel García Márquez é um daqueles escritores fodidos da América Latina. Eu pago um pau para esses caras desde que li na adolescência um livro chamado "A Estrada para San Martín". Mais maduro em relação aos livros-Malhação do Pedro Bandeira. Mas essa é a Major League, então vamos com algo mais pesado. Não, não é "Cem Anos de Solidão" nem "Memórias de Minhas Putas Tristes". O primeiro é muito lugar-comum para o autor, que não escreveu apenas aquilo de bom. E o segundo é caro demais. Ser um intelectual no brasil é como ser uma solitária no bucho de uma supermodel, como diria Furio Lonza. Você morre de fome - pelo menos foi isso que eu entendi do adágio. Por módicos dezoito pilas, vamos falar de "Ninguém Escreve ao Coronel".

O lugar, algum lugar da Colômbia, com alguma relação com a Macondo de "Cem Anos de Solidão" só que ainda não tinha sido escrito. O Tempo, muitos anos depois da Revolução. Tem um quê de relação com a realidade já que menciona "as noticias da Europa" sobre a nacionalização do Canal de Suez, no final dos cinquenta passado. A história: um oficial da antiga guerra civil colombiana espera na sua choupana da sua aldeia no meio do nada a carta que informa a sua pensão por veterano de guerra. Por quase vinte anos. Ele e sua mulher asmática (cujos nomes não são revelados pois, afinal de contas, não precisa já que poderia ser eu, ou você lá) comem o pão que o Diabo amassou tentando se virar com o que possuem e o que vendem. A única esperança dos dois é um galo de briga (que o diga Duda Mendonça, direto do país da piada velha) que pertencia ao filho já finado. Que não é tão finado assim pelo que subentende a narrativa, mas é apenas um detalhe técnico. A questão aqui é como a vila toda se apóia no Coronel e no Galo, já que o Coronel é o dono do galo de briga mais promissor no "Mundo dos Esportes Gillette®" desde o Robinho do Santos. E como o olho dos donos engorda o gado, a mulher cai na real e vê a estúpida empresariagem esportiva que se exerce sobre o galináceo que tem tratamento de rei na casa do Coronel e tenta demovê-lo da idéia de continuar com essa palhaçada toda e tentar ganhar algum dinheiro de verdade por aqui.

A Carta, o Coronel e o Galo são os principais personagens dessa novela (que não é Romance por razões de retórica). A Carta que nunca chega é como um sinal de deus e dos homens de que ainda não é a hora, tal qual a provação de Jacó na casa de Labão tendo que trabalhar sete anos para casar-se com uma baranga e mais sete para levar aquilo que ele queria (na lenda da bíblia); o Coronel que age como o povo que espera a ajuda divina e do governo da America Latina para sair de seu atoleiro financeiro, moral e psicológico (já que o Coronel em várias passagens se vê com flores, cogumelos e demais alucinógenos nas tripas e dá suas viagens na maionese); e o Galo que é a única chance de redenção possível, que é sendo esportista e fugir daqui, dando uma boa vida aos progenitores no processo (aqui são os novecentos pesos que o Coronel sonha em tirar quando vender o Galo na Rinha de Janeiro). Em outras palavras, uma parábola política e antropológica das repúblicas bananeiras.

"Ninguém Escreve ao Coronel" foi levado aos cinemas já faz um certo tempo, passava até na Gazeta quando ainda tinham dinheiro para passar filmes e traz uma estética de peça de teatro com iluminação e tudo o mais, caso vocês sejam vagais a ponto de não conseguirem consumir meras noventa e quatro páginas (na edição da Sabiá, em 1969).

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Matadouro 5. Kurt Vonnegut.

Eu ainda não li os livros do Castañeda, sobre as pirações do cara na mescalina, só que eu acho que no confronto direto Kurt ganha. E com folga. Nosso amigo aqui foi um dos revolucionários da narrativa do romance americano no século XX (bem que poderia ter entrado como tema de TCC, né não?) mas antes disso, como todo bom americano, foi soldado. Na Segunda Guerra. E ainda de quebra viu o bombardeio de Dresden (que matou mais gente que as bombas atômicas sobre o Japão) em primeira mão. Decidiu colocar tudo isso no papel.

Só que não adianta você simplesmente colocar isso no papel. Vira apenas mais um sermão do tipo "oh, a guerra é o inferno" e você acha que está de frente a mais um pastor da Deus É Amor que de um escritor. Portanto, vamos fazer do "outro jeito". Imagine uma série de post-its. Aqueles que se usa para deixar recados ao redor do mundo. Então. Um livro inteiro de post-its narrativos. Uns pequenos, com menos de quatro sentenças, outros com quase seis, sete páginas. Todos eles não-lineares.

Pequenos telegramas da terra das idéias de Billy Pilgrim, personagem semi-autobiográfico que esteve na guerra como ajudante de capelão (oficial não-comissionado) e capturado pelos alemães. Viu Dresden se tornar uma paisagem lunar com poeira de ossos em toda a parte. Voltou para casa, se tornou optometrista, teve seu surto de veterano de guerra e se casou com uma gorda rica cujo pai também era optometrista (tem horas que Kurt trata os optometristas como uma etnia, como os muçulmanos, judeus, ciganos e demais minorias européias no Novo Mundo). Sofre um acidente de avião com seu sogro e outros optometristas e é o único sobrevivente. Se torna então palestrante de uma teoria de que existem aliens da Quarta Dimensão que podem viajar no tempo como se o tempo não fosse mais que uma paisagem onde podemos olhar o passado, o presente e o futuro a bel prazer. E nosso amigo consegue aprender o segredo de se deslocar no tempo e no espaço do mesmo jeito. Em um momento está dando uns malhos na sua mulher gordinha em algum lugar do meio-leste dos Estados Unidos. Vê uma lancha com um casal de ricos passando e resolve ir no banheiro. Então, volta para 1944, no campo de prisioneiros na fronteira da Tchecoslováquia indo dar uma bela obrada chapado de morfina na cabana médica.

Não existe uma única virada de roteiro em Matadouro 5. Você sabe desde o começo onde e quando cada coisa vai acontecer. Não sente pena nem ódio dos personagens. Não tem pena do soldado que é morto por tirar uma chaleira dos escombros, nem do companheiro de "POW Camp" que jura matar Billy Pilgrim e décadas mais tarde descobre que foi ele o assassino de Billy depois de uma palestra sobre os tralfamadorianos (os aliens que o abduziram e o estudaram num zoológico a milhões de quilômetros dali) em Nova Iorque. Você sabe do destino de cada um e apenas acaba repetindo com Billy Pilgrim sempre que algo de ruim (em geral a Morte) acontece com alguém: "Coisas da Vida". Acaba concordando com Pilgrim que não existe uma linha de momentos; que continuamos a existir em outros lugares além da morte.
Um jeito de ver o lado bom das coisas, sem aquela palhaçada gótica do Tim Burton e associados (nada contra Tim Burton, ele ainda fez o segundo melhor Batman do meio audiovisual, perde apenas para o Batiman Feira da Fruta na minha pobre opinião).

Thursday, October 27, 2005

Resenhas frescas como o lixo que está há três semanas se juntando na área de serviço do meu apartamento-protorrepúlbica.

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Old Boy.
"Até quando o Tarantino vai ficar soltando cheques para patrocinar o seu cinema favorito?" foi o que eu pensei quando eu ouvi de terceira mão que supostamente o cabeçudo estaria patrocinando a vinda deste filme para o mercado ocidental. Depois do comercial de Vinólia de duas horas chamado "Herói" eu fico com dúvidas em pensar qual cinema é pior no mundo: o chinês ou o brasileiro. O chinês com sua eterna mentalidade de "Tudo o que sabemos fazer é filme de kung-fu" ou o brasileiro que não tem o dinheiro nem o prestígio do cinema chinês e ainda tem a mentalidade "PORNOCHANCHADA, PORNOCHANCHADA... CIDADE DE DEUS, CIDADE DE DEUS....". Beeela merda. Quando não é isso é o filme dos caipiras filhos da puta (no mau sentido) e coisas como "Pequeno Dicionário Amoroso" ou "Mater Dei". Cinema para a classe média do Meier e demais cantos do meu brasil varonil. Mainardi, aquele abraço, meu quirido.

Mas vamos ao filme. Primeiro roteiro. "Oh Dae-su" é um cara normal, pé-no-saco como todo cara normal. E ainda vive na Coréia. Estava ele retido numa delega por causa de uns pileques quando resolveu ligar para casa de um orelhão. E nisso ele foi sequestrado. Mas não é só isso. Ele ganha inteiramente grátis a culpa pelo assassinato da mulher, a perda da guarda da filha, e um cativeiro num apê sem-vergonha por quinze anos sem uma ou outra palavra. Entre tentativas de suicídio, punhetas para a BoA, e ver o mundo pela tela morna de uma tevê, ele acorda fora dali e começa a procurar a sua vingança contra o desgraçado que fez isso tudo com ele e principalmente "POR QUÊ DIABOS VOCÊ ME PRENDEU AQUI POR QUINZE ANOS SEU PORRA?"

A fotografia tem horas que decepciona, a não ser que ambientes estupidamente escuros em que não se vê porra nenhuma sejam uma idéia do Chanwook Park, o pai de todo esse samba do crioulo doido. A trilha sonora, carregada no clássico, meio que quis dar um operístico a toda a coisa, como se fosse uma reencarnação de Tosca ou Édipo Rei no século XX asiático. Criativo, mas não conseguiu evitar a forçação de barra em certas partes. Segundo o autor da obra, em entrevista para a Ilustrada na Folha de muito tempo atrás, ele gosta de "tratar a vingança como um bom mote" para filmes. Só que na minha visão de um olho só, enxerguei vingança, tabus, sadismo, e uma ponta que deixaria o próprio Nelson Rodrigues orgulhoso do cineasta amarelo.

Sem falar na melhor cena de tortura do cinema moderno, excluindo o "Marido diz que está cansado da vagabundice da mulher" no JK, repetido em looping por 950 horas.

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Copio aqui com direitos a RONALDO BRESSANE do site http://www.fakerfakir.biz a melhor resenha possível para o indicado ao Oscar pela Rede Globo, "Dois Filhos de Francisco".

Não vi e não gostei

Não vi 2 filhos de Francisco. Não gostei do filme. Detesto a música praticada por Zezé Di Camargo & Luciano e todos os seus clones. Detesto a figura dos dois, de sua família, de sua prole. Detesto proles numerosas que têm nomes imbecis como Mirosmar ou Welson. Detesto gente que luta por sonhos tão estúpidos como fazer com que os filhos sejam cantores de sucesso. Não acredito que o tal do Brasil Profundo esteja representado por músicos medíocres de Goiás. Não acredito que a música brasileira tenha ganho qualquer tipo de originalidade, potência ou criatividade através das imitações canhestras do pior country americano mixado à mais rasteira guarânia paraguaia. Jamais poderei acreditar que cantar o tempo todo de modo esganiçado seja bonito.
Abomino profundamente esse consórcio da situação, que alia cinema carioca publicitário conspirativo tonificado com o oportunismo onipresente de Caetano Veloso & baianos associados à música sertaneja criada com grana gorda paulista glorificada em showmícios subfaturados do nosso principal partido "de esquerda", que deu nesse atual cortejo da ignorância liderado pelos primatas Lula e Severino - adulados pela freyriana culpa da classe-média educada pela Veja a ser boazinha com os "desfavorecidos". Hoje, 7 de setembro, seria interessante pedir independência a esse estranho amor pela burrice "tão Brasil" que supostamente nos definiria. Esse Brasilzinho pobre aí eu dispenso.

Não acredito que o Brasil precise de um "blockbuster popular bem-feito" para catapultar seu cinema, como muitos jornalistas complacentes têm publicado, para meu constrangimento. Não acredito na tese de que a música sertaneja explique a passagem do Brasil agrário para o Brasil urbano - ou talvez fosse melhor, do Brasil ágrafo para o Brasil agroboy. Não acredito que música sertaneja explique algo além de ser simplesmente música para que não tem respeito pelos próprios ouvidos.
Desculpem-me, mas, ao contrário dos pais da dupla referida, os meus não são surdos, analfabetos nem cretinos. Ambos de origem pobre, nunca o foram em matéria de cultura. Meu pai, um caipira paulista, ouvia música caipira em casa, divertida, radical, tosca, derramadamente simples, com a classe de quem sabe que aquilo é bom porque não é uma impostura copiada e modernizada, limpa, dedetizada no maldito Estado natal de Bush. Veio do mato, foi boiadeiro, pegava touro à unha, mas nunca quis saber de rodeio, que é esporte pra maricas. Ele também ouvia rock'n'roll, jazz, música clássica, canto gregoriano, música romântica brega, samba, o que viesse. Não tinha delírios de grandeza para os filhos - queria apenas que eles estudassem e trabalhassem. Era um homem que tinha um cérebro entre as orelhas, e as suas, ele as limpava.
Por todas essas razões, não verei e torcerei com todas as minhas forças para o fracasso desse filme que, não bastasse lidar com as emoções mais rasas e com os conceitos mais babacas, é estrelado por um ator insportavelmente mala chamado Ângelo Antônio.
Para quem não entendeu: são os preconceitos que moldam a integridade de um homem e sua visão de mundo. Não é necessário comer merda para deduzir-lhe o sabor. Ou o som.
Faker 01:21 PM 02. Ronaldo Bressane

Cada dia mais eu sou fã desse filho dum jumento (no bom sentido), desde "JORNAL DO CAOS". Quando sé foda, é.

Monday, October 10, 2005

Pobre Menino Rico (atualizado)

Aguentem a mão que logo isso será substituido por uma resenha de "O Apanhador no Campo de Centeio" do Salinger. Sem paranóias.

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Killer Instinct On - Ultra Combo.

Caulfield, Clint & Lee, a filha irlandesa do Kajuru e o Ed aos quarenta anos.

Precisava de uma leitura nova. Como Ed tinha tomado posse do meu "Kill Me Please" e as risadas que ele dava ao ler o livro foram me deixando emputecido, resolvi voltar pra casa. No caminho, lembrei de Mark Chapman ao ver um carinha usando óculos de lente redonda. Decidi ler Catcher In the Rye.
Bom, para aqueles que não sabem do que se trata esta obra, vamos colocar a par dos fatos.

1) É BOM, MAS NÃO É DEUS.
2) HOLDEN CAULFIELD NÃO É O GRANDE ANTI-HERÓI AMERICANO.
3) NÃO MUDOU MINHA VIDA.


Agora podemos falar. A história começa com um desabafo do protagonista Holden Caulfield, menino rico da Park Avenue de NY, que está se eximindo da obrigação de contar a sua vida como se fosse uma passagem de Charles Fucking Dickens. Ele está numa casa de repouso para pessoas com nervos abalados, foi parar lá por virtude de uma crise de nervos depois de ser expulso de sua quarta escola de ricos. Simplesmente boicotava as aulas por achar que seus companheiros eram panacas de mais. "Fora de Brincadeira", em suas palavras. Depois de ser expulso e tomar uma carcada de seu professor de História, ele volta para seu alojamento e dá de cara com seus companheiros "mais ou menos" chegados, o porco Ackley e o insosso Stadlater. A dança da náusea e do sarcasmo do protagonista foram tomando proporções geométricas no momento em que soube que Stadlater havia saído com um de seus affairs antigos, uma certa Jane Gallagher. Depois de uma coça de seu companheiro, decidiu ir embora daquele pardieiro e ganhar o mundo uns tempos para poder esfriar a cabeça. As andanças do pobre menino rico na Manhattan de 50, juntamente com as lembranças de seus irmãos Allie (seu favorito, já falecido), D.B., o roteirista de Hollywood e a pequena Phoebe, a ruivinha que habita os desejos subconscientes do jovem Caulfield sem ele mesmo saber. Ou não.
A mente de Caulfield é coberta de lembranças recalcadas, o recalque maior sobre seus companheiros obrigatórios e a solidão do personagem na "teenage wasteland" que é a "Média Adolescencia".
Talvez pelo próprio ritmo da narrativa ser baseado nos delírios e desventuras do jovem desnorteado, tenha tido o estigma de ser um livro "psicótico". Mas nem é, viu. Esperava mais.

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Dos "Filmes que Alugo quando Chego em Jacareí", resolvi pegar um crássico dos crássicos. A parte final da trilogia de Sergio Leone, "Tres Homens em Conflito" ou "O Bom, o Mau e o Feio".
O roteiro não é muito diferente de qualquer fumetti que você possa imaginar. Em plena Guerra Civil, um caubói sem vergonha na cara e seu sócio bandoleiro chicano (Blondie e Tuco, Clint Eastwood e Eli Buchmann) fazem o "golpe do Flautista de Hamelin" nos territórios da Fronteira, onde Blondie entrega o sócio para depois resgatá-lo no momento do enforcamento, para ir até uma nova cidade e resgatar de novo a recompensa. Paralelamente a isso, o assassino contratado Angel Eyes (Lee Van Cleef) está no rastro de um roubo milionário (ok, não tão milionário assim, mas ainda sim é uma grana lascada) de 200 mil dolares desviados do Exército Confederado. Pela ironia do destino, os três são colocados a par da existência de tal fábula de dinheiro e precisam ora cooperar, ora passar a perna um no outro para chegar primeiro na bolada.
Filmes do Sergio Leone são sempre a mesma coisa, se olhar friamente: Eastwood, um cara de pedra (Van Cleef ou Charles Bronson), planos longos entrecortados com closes empáticos, temas que ficam na cabeça (quem não conhece o tema de The Good, The Bad and The Ugly?) e um enredo com reviravoltas que fazem com que o fã de Western Spaghetti fique curioso para saber onde vai ser a próxima curva acentuada. As atuações de Clint, Lee e Eli estão formando a trinca ideal. O bonzinho de poucas palavras, o mau de olhar sádico (detalhe para a cena do Coro dos Prisioneiros, onde Angel Eyes tortura Tuco para saber mais da localização do tesouro enquanto do lado de fora os prisioneiros cantam uma canção do Sul para mostrar que alguém está no pau-de-arara) e o "mexicano comédia" que mistura ironia com a fina flor da joselitice.

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O outro filme, foi "Veronica Guerin - o Custo da Coragem". Filme feito para levantar o moral de estudantes de jornalismo desacorsoados com o curso.
Conta a história da jornalista Veronica Guerin, do Dublin Independent que sai da pauta de escandalos religiosos de denúncia contra padres para comprar uma "press war" contra os barões do narcotráfico dublinense - como se mexer com católicos na Irlanda não fosse emocionante demais para uma pessoa. Só que ela não conta com recursos como o finado vacilão Tim Lopes. Ela vai nas bocas de fumo, com seu carro de família, estaciona e pergunta pro povo "Quanto estão faturando com esse lance de drogas?". Com ajuda dos investigadores da Garda (a polícia irlandesa) ela vai descobrindo como e quando os chefes acabam lavando dinheiro da heroína para terem a boa vida que possuem.
Impossível não associá-la à falta de noção (de um aspecto positivo) de um outro jornalista brasileiro, o "meu papai" Jorge Kajuru. Só os dois chegariam na casa de um barão da droga local e perguntariam "Como o senhor conseguiu o dinheiro para pagar essa enorme casa?". Creio que Kajuru não teria saído sem dar um soco na cara do Chefão, como fez a versão irlandesa.
Guerin foi morta após sair de um tribunal em Dublin depois do julgamento de um recurso sobre multas de trânsito atrasadas. Tomou um drive-by de um motociclista e mais seis pipocos à queima-roupa. Antes disso, havia ganho um prêmio do Comitê de Proteção aos Jornalistas pelos serviços prestados, e depois disso acabou forçando a adoção de medidas para congelar as pernas financeiras de suspeitos de tráfico de drogas. REalmente a Irlanda é o Brasil na Europa; só que com bolas.
Cate Blanchett, a Galadriel da trilogia fantasy-GLS "O Senhor dos Anéis" conseguiu um feito ao encarnar uma personagem real de uma maneira fodidamente convincente. Nos extras do DVD há uma gravação de um discurso da verdadeira Guerin no CPJ, cuja versão "semi-ficcional" acabou sendo suprimida no produto final. Destaque para uma ponta que Colin Farrell, o novo bad guy de Roliudi.

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Sobre "O Virgem de 40 Anos"... Vou ser bem sincero. ALUGUE "PORKY'S".

Friday, October 07, 2005

Faça valer sua carteirinha do PC.

- Reed?
- Que foi?
- O chefe mandou um telegrama. Quer que você vá pra Russia.
- Onde?
- Russia, fio. Frio, pessoas com chapeu esquisito, ursos polares, imigrantes na America, Russia.
- Tá de sacanagem comigo, Phil. Eu já tou aqui nesse cu de mundo de Iugoslávia da porra só pra cobrir essa guerra dos europeus e ele ainda quer que eu vá pra Russia? O que eu vou fazer nesse fim de mundo?
- Algo a ver com os vermelhos.
- Quê?
- Pois é. Tá correndo a boca-pequena que os russos vão sair de vez da guerra porque a chapa tá quente lá em Petrogrado. Tá caindo a casa geral, ninguém sabe direito se vai ser os comunistas, os cossacos, os nacionalistas, quem vai se dar bem nessa.
- Só espero que o jumento do meu patrão pelo menos pague a minha viagem.

John Reed estava na cobertura da Primeira Guerra Mundial na Europa quando soube das agitações na Russia por conta da Revolução Bolchevique e teceu um detalhado relato sobre os acontecimentos na capital do Império do Leste. Surgiu um dos primeiros grandes relatos jornalísticos em forma de romance, "Dez Dias Que Abalaram o Mundo".

Este livro foi tão fodidamente bem-escrito que os ossos de Reed estão repousando na murada do Kremlin, por ordem do Comitê do PC Soviético "pelos serviços prestados em nome da Revolução divulgando seus verdadeiros ideais". A fluência do negócio é quase uma dimensão à parte de "Os Sertões", o genérico brasileiro. E, pelo que sei, John Reed não teve a cabeça enfeitada por estar escrevendo sobre os comunistas, ao contrário de nossa infeliz contraparte brasileira enquanto esteve comendo poeira e putas tristes no sertão baiano.

Wednesday, September 21, 2005

Estava demorando pra Miramax ir pra berlinda.

"My Big Fat Independent Movie" vem pra colocar um nabo na bunda de todos os amantes do cinema "alternativo". E ainda vai ter gente que irá gostar disso. Sabe aqueles filmes que a sua amiga de óculos com aro grosso vive falando que é a melhor coisa que ela jamais viu e jamais verá de novo? Pegue o santo Tarantino, David Lynch, o novo cinema comunista alemão, as patuscadas de Robert Rodriguez e misture com o melhor de "Apertem os Cintos, o Piloto Sumiu" e uma pitada de filmes do Mel Brooks.

Começa o trailer com uma tela em branco com os selos de premiação de vários festivais, anunciando na sonora: "Once in a great while, a film is so important that captions the attention of the entire world.... This is not one of those films." (Muito raramente, um filme é tão importante que acaba atraindo a atenção de todo o mundo. Esse não é um desses filmes.)
Depois disso passamos para a apresentação dos personagens principais da trama, sendo:

1) Os Assassinos, entrando como Travolta e Sam Jackson de Pulp Fiction, reclamando sobre "um roubo que deu errado em Vegas e precisam botar o pé na estrada". Qualquer coincidência com Tarantino não é mera relação.

2) O "Swinger", cujo conceito nem eu mesmo estou muito por dentro.

3) e a "Garota não-tão-boa-assim", que você pode encontrar em qualquer filme da Julianne Moore.

Juntos dentro de um carro velho, percorrem o Deserto de Nevada trombando com todos e possíveis clichês do Cinema Independente, incluindo um colóquio intercontinental entre "El Mariachi" e Amélie Poulain, a "Garota Alemã" que precisa chegar em algum lugar muito rápido, o cara com olhos azuis com problema de ereção " e também aquele negócio com a memória", a chuva de sapos que "sometimes... it happens" na rua do Tom Cruise, e não podemos nos esquecer das lésbicas da Rua Mulholland. Oras, se Hollywood é comandada pela "Gay Mafia", porque em Sundance não poderia haver uma "Lesbo Triad"?


Os prognósticos desta produção que vem pra representar mais uma "quebrada de perna" nos atuais padrões de sucesso são bons, mas esbarra em alguns problemas. É "Alternativo" demais. Traz piadas que só quem assistiu um filme como "Pi" pode chegar a entender que o "Genio Careca" é uma referencia àquele filme, assim como as cenas de Cidade dos Sonhos que francamente, oito em cada dez pessoas não faz a mínima idéia do que acontece naquele filme. Corre-se o sério risco de ser uma piada de nerd para nerd. "he he heeee.... ele falou sobre o impulso GAMA, quando era para falar impulso SIGMA... he he heeeee.."

Mas vale o risco. Pelo menos para a turminha intelectual, vale o risco.

Oi, meu nome é André e sou um resenhista. "Oi, André...."

Bom, meninos e meninas, esse aqui vai ser o Resenhário, um espaço pra colocar textos explicativos mastigados sobre algumas coisas que forem aparecendo no caminho. Livros, filmes, trailers de filmes, bandas, músicas e demais coisas que merecerem uma resenha. Isso aqui é pra ser um espaço pra colocar balões de ensaio para um certo TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) para uma certa Faculdade de Jornalismo do Interior de São Paulo.

Enjoy the show.